COMBATE ÀS DROGAS: O QUE A ISLÂNDIA TEM PARA ENSINAR AO BRASIL?

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A Islândia é um pequeno país nórdico que ostenta o 6º melhor IDH do mundo.

No final da década de 1997, seus adolescentes estavam entre os bebedores mais vorazes da Europa. Vinte anos depois, o país apresentava ao mundo uma geração de jovens com baixíssimos índices de alcoolismo, drogadição e tabagismo: a prevalência de uso de drogas nos últimos 12 meses para islandeses entre 15 e 64 anos de idade é de 3,4% para maconha; 1% para cocaína ou crack; 0,7% pra anfetaminas; 0,5% para ecstasy; e 0,7% para opióides e opiáceos (1).

Exatamente qual foi o pulo do gato da Islândia?

A história de sucesso da Islândia está profundamente associada aos trabalhos do psicólogo norte-americano Harvey Milkman.

Durante a década de 1970, ao avaliar usuários de heroína e anfetaminas, Milkman observou que estes dois grupos possuíam estilos de personalidade bem diferentes: os usuários de heroína e outros opióides buscavam na droga uma maneira de amortecer a realidade, ao passo que os usuários de anfetamina buscavam uma maneira de vencê-la e conquistá-la (2).

Milkman ponderou que uma maneira de evitar o contato com as drogas seria detectar estes traços de personalidade ainda no início da adolescência, oferecendo aos jovens cérebros atividades que suplementassem aquele “hiato” que, se não fosse abordado do modo correto, fatalmente os conduziria para algum tipo de entorpecente.

Em 1992, Harvey recebeu uma bolsa do governo norte-americano para trabalhar sua teoria junto a adolescentes com elevado risco social em Denver – capital e cidade mais populosa do estado do Colorado (EUA). Ele passou a oferecer aos jovens arte, música, dança, escultura, retórica, pintura e qualquer atividade recreacional saudável que quisessem aprender – uma abordagem quase Aristotélica de “boa orientação do ócio”.

Associado a este roteiro, Milkman colocou seus alunos em sessões de meditação nos moldes de Atenção Plena (mindfulness), para que desenvolvessem as habilidades necessárias para gerenciar suas mentes, aprimorar seus raciocínios e melhorar seu padrão de relacionamento interpessoal.

O ponto central no plano de Milkman residia no fato de que palestras e oficinas de “combate às drogas” não funcionam porque são chatos e desinteressantes. O que falta aos jovens em situação de risco não são palestrantes, mas habilidades e capacidades para lidar com desejos, informações e objetivos.

No final da década de 1990, Milkman foi convidado a levar seu programa para a Islândia (3). Lá, incluiu os pais dos participantes no sistema, fazendo-os perceber que o tempo e qualidade do tempo que passavam com seus filhos fazia toda diferença. Simultaneamente, o governo da Islândia começou a mudar algumas leis: a venda de cigarros foi proibida para menores de 18 anos e a venda de álcool para pessoas com menos de 20 anos de idade se tornou ilegal. A legislação também baniu toda e qualquer forma de propaganda de tabaco e álcool, e passou a ser ilegal a presença de crianças entre 13 e 16 anos na rua após as 10 horas da noite.

Medidas adicionais foram implantadas para estreitar os vínculos entre os pais e as escolas: nas reuniões obrigatórias, os pais recebiam orientações sobre como conversar com seus filhos sobre projetos de vida, a questionar sobre suas companhias e ter controle sobre aonde iam. Em algumas cidades, famílias de baixa renda passaram a receber um Cartão de Lazer no valor de pouco mais de 700 reais por ano por criança, para pagar por atividades como esporte, dança, pintura, teatro e cinema (4).

Durante 15 anos, as capacitações para os educadores, as atividades e entrevistas periódicas com os adolescentes, e os reforços de orientação para os pais foram mantidos com grande método e disciplina. Os foram mais que palpáveis: o porcentual de crianças entre 15 e 16 anos de idade que passavam boa parte de seu tempo livre com seus pais nos finais de semana dobrou (de 23% para 46%), o porcentual daquelas que participavam de atividades esportivas pelo menos quatro vezes na semana aumentou de 24% para 42%, e a prevalência de adolescentes usuários de cigarro, maconha e bebidas alcoólicas simplesmente despencou (5).

As ideias de Harvey Milkman e a experiência da Islândia oferecem um exemplo magnífico de como medidas simples e inteligentes, associadas a dedicação e perseverança, são capazes de produzir resultados extraordinários.

Apesar de a Islândia ter pouco mais de 330 mil habitantes espalhados em uma área de 102 mil km2, isso não significa que os mesmos princípios não possam ser aplicados em um país de 208 milhões de habitantes e 8,5 milhões de km2 de extensão. Tudo que precisamos fazer é replicar o modelo fatiando-o inicialmente para municípios ou cidades com até 300 mil habitantes, por exemplo, e então expandido a experiência para centros progressivamente maiores.

A pergunta não é se a lição da Islândia ou as ideias de Milkman podem ser aplicadas ao Brasil. A pergunta é se temos juízo, competência e boa vontade para tanto.

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Referências:

(1) United Nations Office on Drugs and Crime. World Drug Report 2018. Acessado em https://www.unodc.org/wdr2018/en/topics.html

(2) Harvey B. Milkman, Kenneth W. Wanberg, Cleo Parker Robinson. Project Self Discovery: Artistic Alternatives for High Risk Youth. Wiley (1995)

(3) Young E. How Iceland Got Teens to Say No to Drugs. The Atlantic, 19/01/2017. Acessado em https://www.theatlantic.com/health/archive/2017/01/teens-drugs-iceland/513668/

(4) Icelandic Centre for Social Research and Analysis (ICSRA). http://www.rannsoknir.is/en/home/

(5) Milkman HB. Iceland succeeds at reversing teenage substance abuse. Acessado em https://www.dfaf.org/wp-content/uploads/2018/08/Iceland-Succeeds-at-Reversing-Teenage-Substance-Abuse2016.pdf

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